quarta-feira, 25 de novembro de 2009

ENTREVISTA: Darci (Plebe Bar)

Ele é talvez a pessoa mais importante da cena indaiatubana dos últimos 3 anos por comandar o Plebe Bar, que é praticamente o “templo” do rock e da alternatividade na cidade. O Darci (ou Darca, como os amigos mais antigos os chamam) não inovou ao abrir um “bar de rock” em Indaiatuba, mas, devido à longevidade “atrás do balcão” e, principalmente, por ter permitido que mais 600 bandas tocassem no Plebe (recorde absoluto), não há como negar sua importância na cena. O que tem de banda local que estreou no Plebe não é brincadeira! Quem mais cederia este espaço? E as bandas gringas e renomadas da cena nacional que dificilmente tocariam na cidade se não fosse o bar e os contatos dele? Certo, é muita pagação de pau, mas, ao ler a entrevista a seguir, feita por e-mail, vocês entenderão muita coisa e, certamente, assim como eu, passarão a admirar bastante o cara. Tudo que ele escreveu (e foi muito mesmo, deu 14 páginas no Word!) está aí, na íntegra, sem cortes ou edições significativas! É grande, pode parecer cansativo, mas é muito, mas muito enriquecedor também! Let’s get it on!

Darci, vamos começar com seu envolvimento com o Rock. Gostaria que você contasse um pouco de sua história, como começou a curtir som, quando formou suas primeiras bandas e o que mais quer que tenha acontecido em sua vida que teve o rock como trilha sonora de fundo.

Darci Antonio Montanari, esse é meu nome completo. Nossa! Olha vou tentar resumir e não ser prolixo. Posso te adiantar que não consigo imaginar minha vida sem rock. Pra mim é quase como uma religião em que eu sou um daqueles beatos incansáveis. Essa “doença” me pegou precocemente: com 10 anos de idade eu já achava o máximo as bandas como Scorpions, AC/DC, Ozzy, Iron Maiden, que tocaram no Rock in Rio. Putz, isso foi há 24 anos. Mas considero a minha primeira fitinha comprada, Who Made Who do AC/DC, em 1987 como meu primeiro passo autônomo em direção ao rock. Não sei explicar de onde veio, acho que era o “Espírito do Tempo”. Naquela época os cigarros tinham propaganda livre na TV e os da Hollywood sempre me chamaram atenção, pelos esportes radicais que eram o tema das campanhas, mas principalmente pela música de fundo que era sempre feita por bandas como Whitesnake, Survivor e Heart. Enfim Hard Rock! E eram elas que realçavam a mensagem: “liberdade + ousadia = Hollywood ou o Sucesso” (risos). (Segue um link pra quem quiser conferir no You Tube algumas propagandas da época). O mais engraçado é que eu nunca fumei Hollywood, mas o rock ficou. Fora isso, vários filmes tinham o rock como trilha sonora, então foi dessa forma, através da TV que o rock chegou até mim. Aliás, só assim mesmo, pois na minha família, lá em Águas de S. Pedro e São Pedro, quem ouvia rádio, ouvia AM, e é só música sertaneja ou trilha sonora de novela (que, diga-se de passagem, teve Scorpions, Led Zeppelin entre outras como trilha sonora). Muito bem, isto posto, eis que comecei a trocar idéia com gente que tinha a mesma afinidade musical que eu – isso que é realmente massa: o menor município do Brasil, com mil e poucos habitantes na época em que não existia Internet, tinha já uma galera que curtia rock - e de repente fui apresentado a bandas como Slayer, Dorsal, Metallica, Bathory, Korzus, Onslaught, Necrosis, Angel Dust, English Dogs, Witchfinder General, Cirith Ungol, Ratos de Porão, Attomica, Mutilator, Sepultura, Possessed, Suicidal Tendencies, Assassin, Tysondog. Virei “balançador de cabeça” e fã do Comando Metal, programa de rádio apresentado pelo Walcir Chalas, dono da Woodstock Discos, no Anhangabaú (em Sampa). Pra quem quiser conhecer um pouco mais sobre o cara e a importância dele no cenário metal Aqui vai o link do blog dele (inclusive com muita coisa boa pra download): http://walcirchalas.blogspot.com/ . Só pra que se tenha uma idéia, o programa ia ao ar aos domingos pela 89 FM, que na época era mesmo “A RÁDIO ROCK”, e eu tenho uma fita K7 com o ...And Justice For All que rolou na íntegra antes de chegar às lojas. Meu, hoje não tem uma emoção como essa! A fitinha ta gasta pra caramba de tanto que eu ouvi e, mesmo com problemas de sintonia, tá muito boa a gravação! Pra mim um registro que não tem preço!

A minha pirmeira banda foi a Skória mesmo, mas disso eu falo depois, porque antes da banda (ou de conseguir membros pra uma banda naquela cidade e naquela época...rs) a gente teve uma rádio pirata, em 1990. A gente punha no ar aos finais de semana e quando dava na telha durante a semana também: a Rádio Motta (o nome era uma referência ao nosso “Teiadão”, em Piracicaba: a Clínica de Repouso Dr. Cesário Motta...rs). Tinha até uma vinheta com um trecho da música do Adoniran Barbosa: “A louca chegou”. Essa rádio funcionou esporadicamente durante uns 8 anos mais ou menos e sempre rolando rock, punk e metal. Aí aparecia imitador de Silvio Santos, Gil Gomes... Era muito divertido e tinha uma relativa audiência! Aliás, a galera da cidade e os turistas (Águas de S. Pedro vive do Turismo e no carnaval a cidade chega a ter até 10 vezes mais pessoas) aderiram tanto, que no carnaval de 1995, a gente lançou uma camiseta da Rádio e vendemos em torno de 40 peças, o que, considerando o tamanho da cidade, foi um sucesso absoluto (rs).

Depois da Rádio veio a Skória. Paralelo à banda (1999 a 2000), coordenei um grupo cultural chamado ATUARTE (formado pelos integrantes da banda e amigos que freqüentavam o nosso espaço de ensaio, inclusive o Daniel que hoje lidera a banda piracicabana de Psychobilly Rinha), que com o apoio da Prefeitura de Águas de São Pedro, conquistamos uma pista de Skate na cidade e realizamos alguns fests por lá, em parceira com a extinta UBRP (União de Bandas de Rock de Piracicaba). Publicamos também um fanzine com edição única com o mesmo nome do grupo.

Em 2000 me mudei pra Indaiatuba e aí não pude continuar no grupo que decidiu acabar por ali mesmo. Nesse ano fiz alguns testes pra vocal da extinta banda Insulto (por onde passaram o China do Adrede, o Bastos do Insure Now e Indecents etc.), mas não deu certo.

Em 2001 criei a Distro Futum Records, distribuindo muito material underground. Basicamente punk, hardcore, crossover, grind e “agregados e aderentes, etc e tal”. Vendendo e trocando CDS nos shows e também pela internet. Através da Futum Records, firmei importantes parcerias com selos e distribuidoras do gênero no Brasil como a No Fashion HC Recs (do Sérgio, vocal da Scum Noise), Terrotten Records (Renan, da banda Gritos de Alerta), Usina de Sangue (Fábio do Valle, do Sick Terror), Pecúlio Discos (Boka-RDP), Bucho Discos (André-ROT), o que ajudou muito na divulgação do Skória e até do Kranio. Além de propiciar um lançamento em CD prensado com a discografia da banda DISARM (Hardcore Crust - Santa Barbara D’Oeste-SP). Também pelos contatos firmados entre a Futum Records e os selos, principalmente o Usina de Sangue, consegui agregar ao Fest Punkólatras bandas de peso do underground como Calibre 12, Agrotóxico, Armagedon, Scum Noise, Social Chaos, World Burns to Death (Texas – USA) e ainda trazer para Indaiatuba o Riistetyt (um ícone do cultuado punk hardcore Finlandês), para Sumaré a banda francesa Cochebomba e para Sorocaba uma banda belga chamada Licit, entre outros. Ainda pela Futum, atuei na produção da banda Indecents antes de você entrar (N. do R. ele se referiu a este que cuida deste zine), levando a banda a Piracicaba para gravar seu primeiro CD-R, “I Hate This World”, numa parceria com o Estudio Apache, também distribuindo o material e agitando shows.

Em 2002 conquistei um espaço aos domingos na Summer FM (rádio comunitária de Indaiatuba), onde produzi e apresentei o programa “Pá do Rock”, com 2 horas de rock pesado, do hard ao grindcore, sempre divulgando eventos e bandas underground na cidade e na região, com muito CD-R rolando e com uma participação bastante ativa de ouvintes. Me lembro que era uma loucura, pois eu ensaiava à tarde com a Skória, em Águas de São Pedro, e, mal terminava o ensaio, eu e minha esposa saíamos no maior gás pra chegar em Indaiatuba (cerca de 120 km de distância) em tempo para pegar o material e apresentar o programa. Me lembro também que estava negociando um único patrocínio pro programa com o Júlio, do extinto Taco de Ouro (bar onde rolavam bandas e que era muito freqüentado pela rockeirada) e até ia rolar, mas o bar foi vendido devido a problemas com a vizinhança por barulho. Depois de alguns meses baixou a Anatel e a Rádio parou de funcionar, terminando com o programa também.

Em 2003 entrei na Kranio, em paralelo com a Skória, que era minha prioridade, e a Futum Records. No fim daquele ano acabamos com a Skória e então a Kranio tornou-se minha única banda até 2005, quando tive que abandonar o barco, pouco antes da banda entrar em estúdio para a gravação do CD-R “Últimos Dias” (que ironia do destino, não?).

Enfim, ficando somente com a Futum Records, entre 2005 e 2006 organizei alguns eventos como a Maratona do Rock em Piracicaba, em parceria com o Daniel (Rinha). Esse fest contou com 11 bandas, incluindo Medo da Noite e Kranio, de Indaiatuba. Atuei na produção de estrada da banda Medo da Noite até meados de 2006, quando iniciaram um trabalho junto a Wanday Produções.

Em 2007 participei de uma banda de Stoner Rock, que não vingou, e, bem recentemente, em 2009, montei um projeto sem pretensão alguma a não ser extravasar o stress, tocando um pouco de hardcore e rock paulera sem rótulo, que já acabou também por sinal.

De março de 2006 até hoje estou com o Plebe Bar.



Você é psicólogo e isso deve te dar uma visão bem peculiar das pessoas. Como dono de um bar de rock, que vê e convive com as pessoas mais díspares, como você enxerga o público roqueiro hoje em dia, em comparação com o passado.

Bom, Léo, depois de um certo tempo convivendo basicamente só com gente do rock, fica tudo muito natural e, pra falar a verdade, alguns preconceitos meus foram quebrados por essa convivência. Eu acredito que no geral mesmo pessoas são pessoas, não importa a preferência musical ou estilo de vida, mas claro que há características e hábitos próprios de cada contexto. Nessa coisa de comparação, posso falar daquilo que vivi da segunda metade dos anos 80 até hoje e, o que percebi, é que a escassez de material, a ausência de uma mídia que desse acesso rápido a informações e, principalmente, o contexto sócio-econômico-político-religioso fazia com que o pessoal enfrentasse tantas barreiras pra poder ser roqueiro naquela época que tornavam as pessoas muito mais engajadas, devotadas mesmo e até radicais (o que fazia muito sentido na época, pois ou você era um ”militante”, ou um mais um desencorajador). Naquela época, recém saídos de um regime de 20 anos de Ditadura Militar, onde predominou o medo e incentivou-se a ignorância e o índice de analfabetismo era um dos maiores do globo terrestre, nós vivíamos uma sociedade carregada de puritanismos, dogmas religiosos e muita hipocrisia. Ninguém se lembrava mais o que tinha de tão interessante na democracia, ou melhor, não se sabia como lidar com ela.

Num cenário desse, ser roqueiro implicava ostentar um visual que realmente chocava a grande massa conservadora, chamava muito a atenção da polícia (que ainda tinha aquele ranço de que cabeludo ou gente jovem de roupa esquisita era “comunista comedor de criancinha”) e gerava conflitos, pois naquela época metal tretava na porrada com punk (que no começo, em São Paulo, tretavam entre si, ou seja, os punks de Sampa tretavam com os punks do ABC) e ambos com os skinheads. Então não era tão fácil andar de visual, a pé, de metrô ou de busão, sozinho ou em grupo em São Paulo e também em algumas cidades do interior.

Havia ainda pouco acesso a material das bandas que jorravam aos montes no exterior. Isso era muito limitador, estávamos sempre um passo atrás do que rolava lá fora no primeiro mundo, onde as coisas aconteciam. Só chegava aqui aquilo que alguns heróicos selos resolviam lançar e os “top ten” que chegavam pelas majors da época. Fora isso, só play importado que custava mais do que um salário inteiro. A divulgação era feita boca a boca, ou em raros shows ou ainda nos famosos “sons de salão”, onde algum doido alugava um bailão, ou teatro ou centro comunitário, levava um “3 em 1” e ficava rolando fita e vinil com a galera batendo cabeça que nem nos shows. Havia alguma mídia impressa que ajudava bastante (zines, revistas), mas, mesmo assim não dava conta de tudo que acontecia lá fora e, de certa, forma aqui também.

Resumindo, ser roqueiro não era tomar banho, passar shampoo e condicionador, vestir uma camisa de banda e ir pro shopping se encontrar com a galera. Era sim ostentar uma ideologia mesmo, enfrentar os pais, a família toda, que discriminava o “parente roqueiro”, a sociedade em geral, que via a gente com maus olhos, a polícia, os outros roqueiros que eram de “ideologias adversárias” por assim dizer.

Me lembro que quando eu era moleque e andava pelas ruas de Piracicaba fazia questão de andar por perto das poucas lojas de música da cidade só pra ver se encontrava alguém que curtia som e se possível fazer amizade. A gente que se sentia tão à margem da sociedade precisava muito desse “reforço” próprio do contato com iguais, senão a gente acabava se sentindo o mais errado dos seres da terra. Hoje, a coisa mais fácil do mundo é achar gente nas ruas com “visual”. Se você não achar na rua, acha na Internet aos montes.

Sinceramente, fico feliz que muito daquilo se foi, que roqueiro não seja mais tão mal visto num local como um shopping center e seja tão aceito que ali torna-se um ponto de encontro; que hoje tem tanto roqueiro no mundo que as tias não podem mais falar mal dos filhos das outras porque os filhos delas também curtem rock, ou então fazem tanta caca, que seria melhor se fosse roqueiro; que a polícia seja indiferente no que se refere ao visual; que o acesso às bandas, biografias, discografias, fotos, vídeos, reportagens, entrevistas se tornou praticamente ilimitado em termos quantitativos; que as tretas deram lugar a amizade; que as bandas gringas tenham vindo muito mais constantemente pra fazer shows e tours no Brasil; que bandas nacionais tenham tanto respeito lá fora e principalmente aqui dentro; que haja espaço pra que as pessoas possam se reunir, curtir um show e se sentir à vontade.

Por outro lado, acho que a rebeldia de antes se foi, perdeu sentido e um certo vazio ficou. Haja vista a fase nostálgica que o metal vive hoje, seja pelo som “oitentista” que muitas bandas novas estão fazendo, pela “volta dos que não foram” das bandas daquela época, seja pelo visual que voltou, quase 30 anos depois. E parece que isso não se aplica somente ao metal não e nem somente ao Brasil.

Além disso, o contexto influi diretamente, assim como nos anos 80. Se hoje faz mais de 20 anos desde que saímos da Ditadura e voltamos à democracia, não sem antes termos uma eleição decidida por políticos na maioria corruptos, uma primeira eleição direta onde o presidente (bem ou mal) escolhido pelo povo foi derrubado pela mídia e depois disso passaram-se 12 anos até elegermos um candidato de esquerda que teve de se “endireitar” pra poder ser eleito e permanecer no poder por 8 anos. A igreja católica perdeu muito terreno pra igrejas que não vendem lotes no céu, mas sim sucesso material na terra com as bênçãos do seu deus. A AIDS surgiu e cresceu assustadoramente e a sociedade teve que tratar de sexo mais abertamente. O acesso e o consumo de drogas cresceram muito e as overdoses já não assustam mais como antes matando bem menos. A Internet chegou e revolucionou o mundo das comunicações, pra não dizer o mundo em geral. Eletrodomésticos novos trouxeram muito mais conforto. O acesso a instrumentos musicais tornou-se amplo e praticamente irrestrito. Isso sem contar que muito roqueiro de hoje é filho do roqueiro dos anos 70 e 80, ou seja, já nasceu num ambiente familiar próprio para ser o que é.

Enfim, o mundo tornou-se de certa forma muito mais “amigável” para o roqueiro também. Se antes era um problema social, agora é um consumidor potencial. Porém, a lógica vigente trata tão bem da individualidade das pessoas hoje, que acaba incentivando o individualismo, criando, por exemplo, os “roqueiros de condomínio”, que usam camiseta de banda, tem um cabelo diferentão, todas as discografias das bandas preferidas no PC, é craque no Guitar Hero, tem um instrumento e um headphone pra tirar uns sons das bandas preferidas, mas não se relaciona, não se interessa e nem acha que precisa ir a shows underground, pois ele já conhece as melhores bandas do mundo, então “pra que ouvir banda iniciante ou que vai tocar covers ou mesmo som próprio todo parecido com esta ou aquela banda”.

Outro estereótipo muito mais comum hoje, mas que já vinha desde os hippies, é o roqueiro-músico-nóia. Infelizmente esse tem aos montes e sempre muito exposto. O cara é inteligente, é gente boa pra caramba, toca ou canta muito bem, mas não vai ter uma vida de rock star por conta das drogas. Quando alguém pergunta por que ele não se firma nessa ou naquela banda ele tem respostas na ponta da língua, mas nunca é porque ele prefere chapar o globo a ir fazer aula ou ensaiar. Pra ele basta saber que é bom e a galera da turminha reconhecer seu talento. Ponto. Vale mais uma curtição com a galera que uma vida de músico com todas as frustrações e conquistas que lhe são próprias.

Outro ponto comum entre o roqueiro do passado e o da atualidade é o conservadorismo, por mais contraditório que isso possa parecer. O roqueiro que vive a loucura, a quebra de regras e a liberdade, desfiando as instituições quando adolescente, que ouve e/ou toca músicas cheias de blasfêmias e/ou críticas ácidas à igreja, é o mesmo que acaba, por exemplo, se casando no civil e na igreja, diante de juízes e pastores e/ou padres, padrinhos e tudo o mais que é próprio das instituições “casamento” e “família”, ainda que sob uma trilha sonora diferente, convidados com camisa de banda e cabelo comprido ou moicano. Ainda assim, conserva-se a mesma tradição que traz inúmeras implicações, regras e papéis definidos pela mesma sociedade que ele tanto criticara e procurava viver à margem.

Bom, eu poderia falar mais e mais sobre o assunto, mas deixa pra outra ocasião porque estou na 2ª pergunta e já deve estar cansativo ler tudo isso. Está para além de uma pretensão criar aqui um tratado definitivo sobre o assunto, mas acho que já levantei alguns pontos principais.


Você foi apresentado à cena de Indaiatuba quando tocava com o Skória, de Águas de São Pedro! Conte um pouco da história do Skória! Parece que houve uma tentativa de reformulação dela aqui em Indaiá...

A Skória foi uma banda de crossover montada em 97/98, da reunião de amigos e que tocava muitos covers, na maioria de bandas punks (Ramones, Garotos Podres etc.) como tantas outras bandas já o fizeram e fazem até hoje. Quando a rapaziada começou a pegar certa intimidade com seus instrumentos, a coisa foi tomando forma e aí começaram a surgir as primeiras músicas.

Em 2000 saiu o primeiro e único CD-R “Só para Loucos”. Com o material na mão, saímos na correria pra divulgar mandando pra resenhas e na internet também. Na época tinha alguns sites gringos pra divulgar bandas, como o MP3.com o IUMA, Sonico.com, entre outros. O CD-R foi muito bem recebido em todas as revistas e zines, inclusive Rock Brigade, Valhalla e Metal Head. A banda tocou em diversas cidades do nosso estado e também no RJ, tendo uma boa aceitação do público.

Tivemos o privilégio de tocar em shows e fests com algumas bandas das quais éramos fãs, como Sociedade Armada, Gangrena Gasosa, Subcut, Agrotóxico, Calibre 12, DZK etc. Fizemos também muitos amigos e firmamos parcerias com muitas bandas, as quais sempre que podíamos divulgamos por onde passamos. Participamos de alguns festivais, inclusive o “On The Rocks” aqui em Indaiatuba, fest do Rony Viana, no Indaiatuba Clube, que rendeu uma entrevista no programa de mesmo nome que o Rony apresentava na Educadora FM na época. Essa foi a primeira vez que tocamos aqui e foi muito legal, pois a galera veio em peso. Trouxemos um busão cheio de Águas de São Pedro para esse evento. E o povo agitou pra caramba.

Saímos em 2 coletaneas, a beneficente Noise For Deaf (do Nelson da banda New Your Against Belzebu) e Expresso HC (do Alex da banda Protesto Suburbano). Em ambas com 1 música do CD-R. Nos dois casos isso serviu como importante divulgação para a banda que foi muito elogiada por quem ouviu os CDs. Aos poucos a parceria do meu selo/distro Futum Records com outros selos do hardcore foi ganhando forças e isso ajudou a abrir possibilidade do lançamento em cooperativa do material novo em CD prensado, que já era em parte, apresentado em nossos shows e elogiado em comparação com o material presente no CD-R.

Entre 2002 e 2003 as coisas se complicaram, pois eu morava aqui em Indaiatuba e tinha que viajar todo fim de semana pra Águas de São Pedro pra ensaiar, o que não era nada barato e, como eu tinha de arcar com os custos sozinho, os ensaios passaram a ser quinzenais e, com isso, o material novo ia demorando cada vez mais pra ficar pronto. Houve também problemas com shows que os demais membros da banda não compareciam, o que dificultou a continuidade dos trabalhos. Com a mudança do baixista para Goiás, as atividades foram suspensas e depois de meses de hesitação em testar um membro substituto, solicitei aos demais integrantes uma aprovação de texto de encerramento das atividades e assim a banda acabou. Enfim, a banda teve excelente repercussão aqui e fora do país, rendendo convite pra tocar no Canadá e mais um tanto de outras coisas que ficaram sem conclusão, pois foi na época já em que o fim era posto, porém velado.

Há ainda um material em vídeo, registrado em duas apresentações na cidade de Capivari e uma em Sumaré, que compilei em parceria com a Criar (do Fábio, que era da Shock TV), mas que não foi lançado, tendo parte disponível no You Tube.

Realmente, Leo, houve uma tentativa minha em juntar pessoas para uma espécie de continuidade da proposta da Skória, a princípio aproveitando aquilo que já havia dado certo e aquilo que foi testado e aprovado, só que ficou inacabado, já com idéias novas para um seguimento mais amadurecido, inclusive com a intenção de um novo nome, mas somente quando realmente se consolidasse uma formação, com material pronto e com repertório de show afiadíssimo, o que obviamente não chegou a acontecer, na maior parte dos casos por concluir-se que não havia afinidade com o estilo. De toda forma, foi uma interação muito legal com velhos parceiros e novos amigos. Creio que todos crescemos com a experiência e foi muito divertido enquanto durou. Seguem alguns links para quem quiser conferir um pouco da banda:

- Versão de “Born to Be Wild” (Steppenwolf) – Festival em Capivari (2001)

- Locus Pocus (Material que não foi lançado) - Fest em Sumaré com Kranio, 3º Mundo e Cochebomba da França (2003)

- Myspace com a proposta da volta da banda

- Entrevista comigo no site Heavy Meatal Brasil

Se alguém se interessar, achei um blog em que o maluco colocou Download do CD-R “Só para Loucos” na íntegra



Do que as letras do Skória falavam? Pela sua formação e gosto pela leitura (que eu sei que você tem) imagino que eram bem engajadas...

Olha, são vários temas intrincados.

Nas músicas do “Só para loucos”, as letras são mais engajadas e a intenção era provocar o ouvinte/leitor a refletir sobre “O Controle” instituído, porém não naquela velha e gasta fórmula: “a igreja quer dinheiro”, “a mídia manipula” e “o governo é corrupto”, porque eu já não agüentava mais esse panfletarismo ingênuo que só chove no molhado e não chega a lugar algum, soando até hipócrita quando saído da boca de alguns. Aliás, pra mim hoje isso soa mais alienante do que crítico. A intenção era mostrar as entrelinhas, as intenções por detrás de alguns fatos aparentemente inofensivos. Em alguns casos, como na música “Escolha de Existir”, a coisa é mais direta e até mais simples, porém não menos realista e crua. Essa música é um chamado pra pessoa acordar e valorizar o fato de que pode morrer agora, ou daqui a 10 minutos, e não há como prever ou controlar isso, mas pode escolher viver de verdade, buscando ser um espírito livre, ao invés de viver sendo conformista e cheio de autopiedade, assumindo a responsabilidade por suas escolhas, ao invés de culpar os outros pelos resultados de sua conduta apática.

No material que não foi lançado, há recursos de escrita e jogos de palavras, semiótica e mais um monte de coisas que não havia no CD-R. Já os temas são mais auto-críticos e propõem uma reflexão nesse sentido, buscando encontrar o que foi incorporado pelo “controle” aos nossos valores, conduta e hábitos.

Poderia falar bastante sobre cada música, mas acho importante cada um ouvir e tirar suas próprias conclusões daquilo que perceber. Esse CD-R tem várias referências, desde a capa (cujo logo foi criado pelo baterista), o nome do CD, alguns trechos de letras e algumas vinhetas e arremates de músicas entre outras coisas.



E como foi aquele período que você tocou guitarra no Kranio? Foi sua última investida como músico no cenário musical mesmo ou ainda tem algo por vir?

Essa foi uma experiência muito legal. Foram alguns anos de muita dedicação, ensaios, shows e amizades que se consolidaram. Sem falar que tocar hardcore com um baterista que sabe fazer o legítimo d-beat era um sonho que se realizou.

No início era uma investida à parte do Skória. Os ensaios eram do tipo 35 ou 40 músicas em 2 ou 3 horas e eu era mais um amigo que tentava acompanhar o esquema dos caras do que um integrante ativo e tals. Mas, com o fim do Skória, a Kranio passou a ser a minha única banda e aí a dedicação passou a 110%, a ponto de fazer das tripas coração pra que nenhum ensaio deixasse de acontecer e que nenhum show confirmado deixasse de ser cumprido, doesse a quem doesse, mesmo com mudanças de formação, mesmo com perda de integrantes nesse processo. E foi assim que se fixou a formação Marcão (bateria-voz) Tiago (guitarra) Fórfe (baixo) e eu na outra guitarra.

Foi a primeira vez que fiz um site para uma banda e foi o único site oficial da Kranio, até que depois que eu saí, eles me pediram pra tirar do ar.

Em dois anos tocamos em muitos lugares e várias vezes em alguns bares com o Underground, de Sorocaba. Tocamos com muitas bandas respeitadas e algumas das quais éramos fãs, como na primeira vez que o Kranio tocou com Sociedade Armada, Cólera, Riistetyt (Finlândia), Licit (Bélgica), Cochebomba (França), Agrotóxico, Social Chaos, Scum Noise, Armagedon, PPA, entre outros.

A agenda da banda bombava e ensaiávamos duas vezes por semana, com 3 horas para repertório de show e 3 horas para trabalhar em material novo, que compôs o CD-R “Últimos Dias”.

Infelizmente o tempo estava cada vez mais escasso para mim e, assim, anunciei minha decisão de sair, pouco tempo antes da Kranio entrar em estúdio. Decidi que não seria justo gravar o material e esperar sair com meu nome e a minha foto pra depois cair fora. Meu último show foi aqui em Indaiatuba, no extinto Hangar XVIII, com Cólera e bandas amigas. Apesar da tristeza, minha saída foi recebida numa boa e restou a amizade. Lembro-me que o Marcão me disse: “Seu lugar vai continuar lá. Não vamos chamar outro guitarrista. Se um dia der certo você volta.”

Mesmo depois de minha saída, continuei durante algum tempo, naquilo que me era possível, conseguindo e intermediando algumas datas como o show com Ratos de Porão, no Underground Bar, um show com Lobotomia e Calibre 12, em Campinas, um show com Cólera, em Boituva, e uma participação em São Paulo numa comemoração do Orkut do Cólera, com várias bandas tocando, inclusive um Clash Cover do Redson e uma palestra/bate-papo dos 25 anos da banda.

Olha, Léo, não posso dizer que foi a última investida por não saber o que o futuro me reserva, porém tem sido difícil pra encontrar: 1- tempo pra me dedicar seriamente a uma banda; 2- integrantes com afinidades musicais e com pelo menos o mesmo nível de dedicação.



O que é ser Punk para você? Ainda vê algum sentido neste movimento?

Poderia falar pra você que ser Punk é não ser mais um fantoche na mão do governo, é chocar a sociedade com um visual agressivo, música simples, crua e barulhenta, protestar contra tudo que há de injusto, criticar a igreja, o estado, todas as instituições e a classe dominante, não trabalhar pra não alimentar a máquina do sistema, não usar nem consumir produtos estadunidenses pra não alimentar o imperialismo e todos os ouros clichês dos gêneros “diga não” e “faça você mesmo”, mas essa coisa de “ser Punk” acho que é vestir um estereótipo e, aliás, um dos mais visados. Em geral as pessoas “ideologizam” demais pra ser rock ou escracham demais pra ser ideológico. De um jeito ou de outro, é muito fácil cair em falácias e, no final das contas, sobrar somente a contradição e um papel de “bobo” da turma.

De outra forma, acho muito importante para o crescimento e evolução, tanto do ponto de vista do indivíduo como do ponto de vista da sociedade, que existam pessoas engajadas em causas e ideologias, pois isso reflete alguma liberdade de escolha e de manifestação artística, cultural, política, científica, enfim, humana, e essa liberdade não está definida ou delimitada em leis, estatutos, tábuas dos mandamentos, e sim (des)construída, dentro de cada um de nós. Obviamente, o contexto sócio-econômico-político acaba sim, delimitando conseqüências para nossas manifestações, mas não as manifestações em si, visto que nos EUA, por exemplo, existe a pena de morte em alguns estados, porém isso não impede que adolescentes estadunidenses comprem armas e entrem em escolas matando quem quer que lhes dê na telha, por exemplo. Além disso, a criminalidade lá não é baixa e o índice de estupros é alarmante, apesar das duras leis, de uma aparente força policial adequada e do judiciário desvinculado do estado.

Trocando em miúdos, não acredito em “ser Punk”, mas sim em “estar Punk”. Em termos de visual, não dá pra esquecer que aqui é “o país do carnaval” e que a parada gay movimenta muito mais gente do que qualquer passeata ou protesto punk. Entendo como um estado de espírito e não uma maçaroca de regras comportamentais rígidas, doutrinas e dogmas a serem seguidos e respeitados de acordo com uma cartilha. Nem tão pouco um amontoado de comportamentos bizarramente autodestrutivos e nem mesmo uma conjugação dos dois extremos, como por exemplo, ser vegan e usar drogas. Aliás pra mim, não há nada que aliene e controle um ser humano tanto quanto o vício em drogas. Nem a igreja, a mídia ou o capital conseguem realizar essa tarefa tão bem.

Eu acredito que há sentido no Punk enquanto houver uma sociedade, porém esse sentido se movimenta assim como a sociedade. Não dá pra ser ingênuo ou hipócrita e negar as contradições que são inerentes ao ser humano, mas dá sim para fazer da contradição um ponto de partida. É muito fácil criticar as instituições, mas não dá pra esquecer que nascemos e vivemos no capitalismo e que tudo o que existe e que nos dá algum prazer ou sentido na vida foi produzido “no, pelo e para” o capitalismo em última instância. Por exemplo: Se na China há mão-de-obra semi-escrava nas fábricas de componentes eletrônicos, talvez graças a essa infeliz exploração exista tecnologia pra comprar um CD importado de hardcore finlandês pela internet ou baixar um vídeo, ou uma discografia, e gravar num DVD, ou ainda falar pelo MSN com um amigo de outro país, ou quem sabe encomendar aquele coturno da marca Doctor Martens... É dessa contradição que se pode partir. Já basta de sentar em cima do rabo e falar do rabo alheio! Crítica por crítica, até os corruptos e sonegadores de impostos sabem criticar, “puxando a sardinha pro seu lado”, sentados em suas poltronas de couro ou em frente ao televisor de última geração, assistindo as novidades do Jornal Nacional.

Da parte que mais me interessa, que é a música, acho que hoje, depois de trinta e poucos anos, o Punk Rock e seus derivados apresentam muito sentido e contribuíram, e ainda contribuem, demais com o rock em geral. Graças ao Punk, o rock se desburocratizou, retomou vigorosamente sua essência mais instintiva, visceral, e explodiu barreiras impostas por tabus. Tornou público o impublicável, botou o dedo na ferida narcísica de muitos “almofadinhas” e ainda rendeu muita grana pras gravadoras.



Quais suas bandas e estilos favoritos, dentro e fora do rock?

Taí mais uma pergunta que exigiria uma resposta longa demais.

Atualmente, dentro do Rock: AC/DC, Motorhead, Slayer, Pantera, Metallica, Down, Ramones, Black Sabbath, Grand Magus, Entombed, Rage Against the Machine, Atomic Bitchwax, Death, Zeke, Ratos de Porão, Scum Noise, Joe Satriani, Sepultura, English Dogs, Machine Head, D.R.I., Rush, Jethro Tull, Soundgarden, Morbid Angel, Fu Manchu, Corrosion Of Conformity, Napalm Death, Suicidal Tendencies, Fear Factory, Steppenwolf, Captain Beyond, Kyuss, Raul Seixas etc.

Fora do Rock: Falcão, Tião Carreiro e Pardinho, Cacique e Pajé, Tonico e Tinoco, Paco de Lucia, MPB4, Chico Buarque, Toquinho & Vinicius, Baden Powel, Billy Cobham, entre outros.

Estilos: Blues, Hardcore, Moda de Viola, Progressivo, Punk, Thrash Metal, Crossover e Stoner são meus estilos preferidos atualmente, mas eu ouço muito mais coisa.


Falemos agora do Plebe Bar, que praticamente herdou todo o status antigo Blackout, apesar de ainda existir o Pirata’s Bar. É meio que um “sonho” ter um bar de rock com espaço para as bandas mostrar seu som?

Bem, eu não conheci o Blackout e não faço a mínima idéia de como era ou do que seria esse tal status, mas espero que seja alguma coisa boa, porque herdar problemas e dívidas não parece ser legal (N. do R.: O tal status da pergunta é de ser “o” bar de rock da cidade). Acho que ter um bar de rock é um “sonho” pra muita gente, assim como pra mim. A realidade, porém, é muito mais ampla e complexa do que aquilo que se imagina. Mesmo eu já tendo vivenciado muita coisa no rock, há fatos que somente no contexto de bar que se pode viver. Basta lembrar que a maior parte dos bares de rock duram pouco tempo. Eu costumo usar o seguinte comparativo de um amigo meu: “rock no Brasil é como andar de CG 125 na contra-mão.” Mesmo assim, o espaço está aí e já passando a marca das 600 bandas, algumas tendo tocado diversas vezes, em pouco mais de 3 anos de funcionamento.


Percebe-se que a proposta do Plebe hoje em dia é pouco diferente do que era no início, em 2005. Mesmo assim, quem vai lá sente a mesma “essência”. Quais eram suas intenções quando o bar abriu e no que elas mudaram hoje em dia? É o fator “grana” que ainda dita as regras para a manutenção do bar?

Não resta dúvida que a proposta mudou sem perder a essência, mas isso foi um processo natural, onde aquilo que era dos outros se foi com eles e aquilo que era comum e que também era meu ficou.

A intenção principal era firmar a cidade de Indaiatuba no cenário rock de São Paulo, trazendo bandas para atender uma necessidade do público da cidade, gerando oportunidades para as bandas locais, possibilitando intercâmbios, incentivando a formação de novas bandas e, principalmente, instituindo um local que pertença à galera que curte rock.

Essas intenções continuam sendo as mesmas da proposta atual, com o acréscimo de que há uma preocupação em possibilitar uma interação maior com o público, e entre as diversidades culturais também, visto os eventos e festas organizados por clientes.

Olha, Leo, sobre o “fator grana”, eu descobri pela experiência que ninguém consegue agradar a todos, ninguém se interessa se você tem contas a pagar, ninguém é tão altruísta que trabalhe de graça e não existe uma pessoa no mundo registrado no cartório com o nome “ninguém”, mas se você se afundar em dívidas bancando a diversão alheia, muita gente vai ser seu “amigo” até a diversão acabar. E mais: se sua irmã for gostosa e você a convencer a dar pra todo mundo, vai ter fila de neguinho na porta da sua casa e na saída vão te pedir um isqueiro emprestado e ainda tirar um sarro da tua cara, mas o pior seria ouvir comentários do tipo “ela nem era tão gostosa assim, deviam me pagar o dinheiro do busão pra vir aqui.”

Então, sem dinheiro não se come, bebe, dorme, vive. Pode ser que uns não paguem por isso tudo, mas com certeza alguém paga por esses. Eu particularmente trabalho muito, e com prazer, e acredito que mereço receber pelo meu trabalho, embora a prioridade quando se tem uma empresa é mantê-la funcionando, o que invariavelmente exige muitos sacrifícios que nem todo mundo agüenta, seja de trabalho, seja de grana.



O Plebe foi montado em parceria com a galera que formava o Kranio, mas houveram desentendimentos e hoje, apenas você e seu sogro sobraram no comando. Sem polêmicas e “fofoquismos”, há alguma coisa que você gostaria de esclarecer pra galera que freqüenta o lugar sobre este assunto?

O fato é que éramos 4 sócios, sendo a Fabiana, Eu, o falecido Marcão e o Tiago. O Sr. Nelson, sempre que pode, está lá dando uma força desde o começo do Plebe, porém o faz voluntariamente. Ele curte dar essa força e ainda jogar um xadrez ou uma dama com a galera.

Essa coisa de desentendimentos é inevitável quando tem 4 pessoas no comando de qualquer empresa. O lance é que em algum momento você cede à vontade de um, no outro momento os demais cedem à sua vontade, mas consenso é pouco freqüente e, como dizia Nelson Rodrigues, “toda unanimidade é burra”. Essa tensão é desgastante e, juntando outras responsabilidades e outras prioridades na vida de cada um, pronto: o inevitável acontece.
Infelizmente chegou o momento em que cada qual decidiu deixar o bar, com as suas respectivas razões, ficando para mim a decisão de continuar sozinho ou de buscar alternativa.

Da minha parte não há ressentimentos e, desde o momento em que fui surpreendido com a notícia da saída dos dois últimos, respeitei e acatei a decisão tomada. O que era devido foi pago a quem de direito e ponto.

Foi assim que eu apreendi esse episódio em Dezembro de 2006 e é assim que eu o entendo hoje, em setembro de 2009 (N. do R.: época da entrevista).


Estou sabendo que as baladas de som eletrônico que rolam de quinta-feira estão bombando. Sabendo que seu negócio é rock mesmo e que sempre viveu no underground, no meio das bandas, como você se sente com esse “sucesso do inimigo” no seu território?

Hahahhha. Muito legal! Então, bombou sim algumas quintas e foi muito legal ter um pessoal novo, dando uma dinâmica diferente ao Plebe. O pessoal habitué teve diversas reações e o pessoal que chegava pros eventos também teve diversas reações, mas tudo muito positivo, apesar dos bochichos e reclamações (inevitáveis, diga-se de passagem).
Olha, se o sucesso foi “do inimigo” eu não sei, mas sei que foi esse sucesso que pagou as contas, quando vários shows bacanas com ótimas bandas de rock não receberam o prestígio do público necessário para tanto. Assim, os eventos Chic House foram uma oportunidade para um pessoal muito gente boa e criativo ter espaço e confirmar que merece continuidade do projeto. Por outro lado, acho que valeu pras pessoas se depararem com seus preconceitos, tanto de um lado quanto de outro, e alguns aprenderem algo com isso, ou reafirmarem aquilo que já pensavam. Concluindo, foi muito positivo.


O Plebe ainda está à venda? Como anda este assunto? Eu sinto uma enorme torcida contra, porque todos (eu incluso) têm medo de que você saia e percamos mais um espaço de rock na cidade...

Não. Este assunto está encerrado. O único motivo pra venda do bar era o fato de que a minha esposa trabalhava e praticamente morava em Sampa e, comigo no bar 16h por dia, a gente não se via mais. Quando ela chegava no fim de semana eu estava no Bar. Quando eu chegava do trabalho ela estava acordando e eu indo dormir. Quando eu acordava pra trabalhar ela ia dormir. Enfim, estava insuportável e por isso a decisão de venda do bar.

Agora, ela voltou pra cá e não há mais motivo pra vender.

Realmente há torcidas e “retorcidas” com esse assunto. Mas nem todos com o mesmo pensamento seu, Leo.

Sobre essa preocupação do pessoal em perder o espaço do Plebe, só me resta evocar Antoine De Saint-Exupery e o seu clichê mais realista tirado do livro “O Pequeno Príncipe”: "Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas." E isto tem que ser uma via de duas mãos.



Quais as bandas que fizeram os shows mais fodas que você já recebeu no Plebe? Qual te deu mais “orgulho”?

Olha, Leo, pra mim os shows mais fodas foram aqueles em que as bandas chegaram com humildade, fizeram a montagem dos equipos, passagem de som rápida e tranquila e tocaram com toda energia do mundo, transmitindo carisma e empolgação. Orgulho dá a cada banda que chega e vai embora feliz, agradecendo com a sinceridade nos olhos, independente de estilo ou de status.


O que o futuro reserva para o Plebe? Tem algo planejado a curto ou mesmo a longo prazo de novidades?

Tudo o que posso dizer é que há grandes surpresas por vir.


É isso aí! Obrigado pela entrevista, Darci! O espaço é seu!

Eu é que agradeço pela oportunidade, o prazer e a honra de contribuir em algo (assim espero) com o IRZ.

Todo trabalho no sentido de promover o Rock é sempre importante nessa luta diária, que nem todos percebem ou valorizam. Porém este espaço aqui em especial é pioneiro, feito ao mesmo tempo por paixão e por gente que entende do assunto e de suma relevância, inclusive indo de encontro à proposta do Plebe, para firmar esta cidade no cenário Rock paulista e, quiçá, brasileiro.

Longa Vida ao Indaiá Rock Zine!!!


SKÓRIA: